Casa Ímpia
2008-09-12
Quatro intermináveis anos de julgamento e não se antevê ainda quando irá terminar o processo Casa Pia. Mas já se adivinha como: vai dar em nada.
Depressa o regime se encarregará de apagar a memória colectiva, da mesma forma que Salazar encobriu essoutro escândalo sexual, o "ballet rose". As verdadeiras vítimas, as crianças casapianas, chorarão em silêncio, calarão interiormente a sua raiva. Abandonadas em tempos pelas famílias, recebidas numa Casa Pia que as usou e maltratou, serão agora de novo esquecidas, desta vez pela Justiça.
Independentemente de outros culpados, é ao estado português que devem ser assacadas responsabilidades. Durante anos, de forma reiterada, crianças inocentes, foram retiradas às suas famílias para a tutela do estado, no pressuposto que delas iria cuidar e proteger. Mas aconteceu exactamente o contrário. De forma activa ou conivente, funcionários públicos de diferentes estatutos usaram os seus cargos para enriquecer com o tráfico de crianças, que forçavam à prostituição ao serviço de depravados ricos da alta sociedade lisboeta. O estado português foi responsável, cúmplice e conivente, ao mais alto nível, com a exploração de menores, para os quais a "casa" não foi pia, mas ímpia.
O processo Casa Pia ficará pois para a história como uma das maiores vergonhas da história de Lisboa e de Portugal. Com o nome irremediavelmente manchado, a Casa Pia, tal como a conhecemos, deve ser extinta. Por respeito a quantos sofreram no seu passado e para protecção do futuro das crianças que hoje estão à sua guarda. Cada um dos colégios que constituem o seu universo está sob desconfortável suspeita, cada um dos seus alunos acaba, mais cedo ou mais tarde, por ser estigmatizado. Desmembre-se pois a organização, autonomize-se e reestruture-se cada um dos seus estabelecimentos e transfiram-se as crianças para entidades que verdadeiramente as protejam, onde possam viver em paz e sem qualquer estigma.
Nesta extinção que se impõe, poderá ter um papel primordial Paulo Pedroso, que agora reassume funções políticas, também na área social, onde se notabilizou enquanto governante. Já teve inclusive a tutela da Casa Pia. Por conexões ao processo, Paulo Pedroso esteve preso, ao que agora se sabe, irregularmente. Terá descido aos horrores do inferno, naquela cadeia onde passou cinco azedos meses. Mas decerto tempos bem menos amargos do que os vividos por aqueles inocentes miúdos casapianos.
Um comentário:
Em tudo de acordo e mais ainda, esta cultura de conivéncia declarada , ou tácita, ou simplesmente muda, não mudará em nada as memórias e as vidas desses miúdos e jovens,seja qual for a sentença. o abandono, a perversão dos afectos tão cedo e precocemente genitalizdos, a venda, troca , sedução o que se quiser designar, deixAM MARCAS INDELÉVEIS na história de vida de cada ser. Isso se não irrepáravel, tem que ser EVITÀVEL.
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