Dei por mim a recordar os tempos que ali passei quando era puto. E acabou por ser muito emocional. Eu nasci ali. Mesmo ao pé do Estádio do Bonfim. Onde é hoje aquela estação de serviço da Galp, era a minha casa. E eu nasci mesmo ali. A minha saudosa avó Júlia foi a parteira, como aliás, era a de toda a gente ali da zona. Por isso tinha tantos afilhados. Como eu, que era mais um como antes já era o meu irmão mais velho, Isaque.
Comecei a lembrar-me, ao olhar para o restaurante do parque, a que toda a gente trata por "o restaurante do Bonfim", que foi ali que tive a minha primeira experiência profissional. Não, não foi exploração infantil. O meu pai era o que na altura se chamava "mestre de obras" e foi incumbido de acompanhar a obra que ali está feita. O Restaurante do Parque Bonfim. Eu devia ter entre os oito e os dez anos de idade. Não posso precisar. Estávamos no período das férias e o meu pai levou-me com ele para o serviço. E pôs-me a trabalhar. A minha função era a de apanhar pregos tortos do chão e, com um martelo, endireitá-los de maneira que pudessem voltar a ser usados pelos carpinteiros de cofragem. Lembro-me de me ter dito, entre outras coisas: "O importante é não estar parado. Nem que tenhas que tirar uma tábua de um lado e depois voltar a coloca-la no mesmo sítio" e, a caminho de casa:" Se um dia chegares a mandar em alguém, nunca lhes mostres os dentes". O meu gabinete de "técnico endireita pregos", como se diria agora, era mesmo por baixo da escada que leva ao terraço do restaurante, para estar protegido, já se vê. Não é à toa que se é o filho do chefe. Não me lembro se fiz um mês de "trabalho", mas o que é certo é que nunca mais me esqueci. Lembrei-me ainda dos passeios que dava por ali nesse tempo. Duma biblioteca itinerante que ali havia e onde li os meus primeiros livros "a sério". As vinte mil léguas submarinas, Viagem ao centro da Terra...e outros "Julios Vernes" que lá havia. O Sandokan e os Asterixes que haviam na altura....mas também os Falcões e o Mandrakes. O Major Alvega e o N3 (espião secreto). No tempo do fascismo havia lá disto. Uma biblioteca para os putos lerem. E musica clássica aos fins de semana onde eu ia, por vezes, passear com a minha irmã Júlia que já nesse tempo cantava no Coral Luisa Tody e era amante da dita musica. Lembro-me dela ir a uma casinha que havia ao lado das casas de banho e havia um senhor já entradote na idade que fazia daquilo um hoby. Pôr musica clássica aos fins de semana no Parque do Bonfim para que soasse nas colunas que haviam, instaladas nas arvores, por todo o Parque. E lá ia a Júlia pedir para ele pôr o Coro dos Escravos Hebreus da Opera de Nabuco de Verdi. Ela sabia aquilo tudo. E cantava. E eu ouvia. E mais tarde aprendi também. E dei por mim a pensar na influencia que as Júlias tiveram e têm na minha vida. E porque é que no tempo do maldito fascismo havia bibliotecas e musica clássica e agora não? E porque é que me deu para estar a escrever isto? Que se lixe...um blogue é para isto mesmo. E a julgar pelos comentários também, ninguém deve ler.
domingo, 21 de outubro de 2007
Faz parte do Corriculum Vitae
Fui,um dia destes, ao Parque do Bonfim com a minha Julia. Ela para andar de bicicleta e eu numa de pai, ali a olhar para as arvores, para quem passava...ainda encontrei alguns amigos (todos numa de pai).
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7 comentários:
Enganas-te!
Passo por aqui de vez em quando e leio o que houver para ler, vejo o que houver para ver e oiço o que sugeres que se oiça. Quase sempre são verdades "incomentáveis".
Este último, sim, propicía-se. Tens razão: vivi também essa biblioteca metálica verde (?) com portinhas de vidros de correr (confesso que da música não me lembro) e tudo o resto que referes como "literatura" de então.
Agora não há nada. Nem patos! (será que ainda há peixes?).
Também te lembras? Fantástico. Era mesmo de metal, a biblioteca. A ideia que tenho é que era azul, mas o que é que isso interessa?? A musica era só aos fins de semana e não era todos. É natural que não te lembres. Eu era praticamente "obrigado" a ouvir...
Não sei porquê mas fico contente de mais alguém se lembrar daquela biblioteca. Guardei sempre um carinho especial por aquele sitio.
Um abraço Paulo.
Não mano, não é um desabafo em saco roto.
Também me lembro de tudo isso.
O homem que guardava a biblioteca itinerante era Cigano, não sei se te recordas.
O que punha a musica era parecido com o personagem que fez o filme regresso ao Futuro, cabelo branco comprido.
Em relação aos pregos, tive a vantagem de quando cheguei, já estavam todos direitos.
Bj
António
Olá!
Ainda há alguém que comenta e pelas tuas recordações recorda também...
Apesar de não ter nascido no Bonfim, nem em Setúbal, nem em Portugal, também deste sítio tenho boas recordações
Ah, podes perguntar ao teu irmão...
Acho que ainda há peixes!!!
Senão pelo menos rãs e girinos...
bj
Olha a minha Elsinha....
Então Fofa? Obrigado pela visita.
Quando fazes um blogue também? Ou já tens?
Aparece sempre.
Ana Recio
Tambem me lembro do jardim do Bomfim de antigamente, passava lá todos os dias a caminho da escola(Comercial)os namoros e tudo o resto, faltam os patos e os peixes esses deram de floques para o jardim de Algodeia façam uma visita é agradavel. Visitei este blogge por causa do nome Marrafa pois sou amante de Genealogia e tenho especial interesse neste sobrenome só que não consegui encontrar a tal genealogia do carteiro de Palmela.
Ana Recio,
Posso ajudar-te neste aspecto. Só preciso do teu contacto. Tens Blogue? Mail? Como achares melhor.
Fico contente pela visita.
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